sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

A Mancha Humana


O texto que hoje publico é resultante de uma das minhas ciber navegações, mas garanto-lhes que é sem duvida qualquer coisa que me apaixonou de súbito, como que tropeça ou como quem bate com a cabeça sem querer.
Apesar de ser um pouco extenso, rogo-vos que leiam apenas um pouco e logo verão que não conseguem parar. Se forem como eu e ficarem intrigados, só lhes resta mesmo comprar o livro.
Bom fim-de-semana.


[...] Alguma vez viste, nos jornais, aquelas fotografias de crianças, depois de terem bombardeado as suas cidades? Era assim. Tão grande como uma bomba. Mas por muito que fosse bombardeada, eu continuava de pé. Essa foi a minha desgraça: continuar de pé. Depois fiz 12, 13 anos, e comecei a ter mamas. Comecei a ter o período. De repente, passei a ser apenas um corpo que cercava a minha rata... Mas fica-te pela dança. Fecha todas as portas, de antes e depois, Coleman. Eu estou a topar-te, Coleman. Não estás a fechar as portas. Ainda conservas as fantasias do amor. Sabes uma coisa? Preciso, realmente, de um tipo mais velho do que tu. Que tenha perdido por completo todas essas tretas de merda do amor. És novo de mais para mim, Coleman. Olha para ti. Não passas de um rapazinho apaixonado pela professora de piano. Estás a prender-te a mim, Coleman, e és demasiado novo para uma mulher do meu género. Eu preciso de um homem muito mais velho. Creio que preciso de um homem com 100 anos, pelo menos. Não tens nenhum amigo de cadeira de rodas que possas apresentar-me? As cadeiras de rodas agradam-me: posso dançar e empurrar. Talvez tenhas um irmão mais velho. Repara em ti Coleman. A olhar-me com esses olhos de colegial. Por favor, telefona ao teu amigo mais velho, peço-te. Eu continuo a dançar, basta que lhe ligues. Quero falar com ele.[...] Quando se prova, nunca mais se esquece. Ai, ai. Depois de duzentos e sessenta broches, quatrocentas quecas normais e cento e seis no cu, começa o namoro. Mas é mesmo assim que as coisas são. Quantas pessoas no mundo amaram antes de foder?[...]- Não pares - repete ela - Já ouvi essas palavras em qualquer lado. - Na verdade, raramente ouvira essa forma verbal sem ser antecedida por um «não». Não de um homem. Não muitas vezes de si mesma. - Sempre pensei que «não pares» era uma palavra só.- E é. Continua a dançar.- Então não a percas. Um homem e uma mulher num quarto. Nus. Temos tudo, não precisamos de mais nada. Não precisamos de amor. Não te rebaixes, não te tornes num idiota sentimental. Estás mortinho por isso, mas não o faças. Não percamos isto. Imagina, Coleman, imagina mantermos as coisas deste modo.Ele nunca me viu dançar assim, nunca me ouviu falar assim. Há tanto tempo que eu não falava assim que julgava ter-me esquecido como era. Tanto tempo escondida. Ninguém me ouviu falar assim.[...]- Imagina - diz -, vir todos os dias... e isto. A mulher que não quer ter tudo. A mulher que não quer ter nada.Mas nunca quisera tanto ter alguma coisa.[...]- Não há ninguém como tu. Helena de Tróia.- Helena de Lado Nenhum. Helena de Nada.


Philip Roth in A Mancha Humana
Picture by Pavel Kiselev

Nota: texto e imagem retirados de: http://exquisitcorpse.blogspot.com/ (Blog altamente recomendado)

6 comentários:

João Paulo disse...

Caro Amigo Zé, apesar de não comentar o teu espaço, as visitas ainda assim são algumas, menos do que desejava, mas a vida assim o impera... como disse recentemente a um professor, nada desculpa atrasos (isto por vias de entrega atrasada de trabalho de grupo), neste caso nada desculpa a falha dos comments, mas como podes ver arranjei uns "trabalhos do diabo", voluntário é certo, mas não deixa de ser trabalho, voltei a ser estudante! (só espero é que não me apelidem de presunçoso por dar esta "novidade" ;) . Por esta razão, justifico a minha ausência, se é que é justificativa! Mesmo assim, e como já tive ocasião de o fazer, agradeço todas as visitas e comentários feitos ao meu espaço, ao nosso espaço!
Assim, cá vai um abraço fraterno deste compadre e, como diz a malta, BOM FDS!!! :)

Anónimo disse...

Caro Zé Camões

Quem se sente lisonjeado e agradecido sou eu, por um antigo aluno, (não gosto de "ex-aluno"), se lembrar de mim. Obrigado. Fico contente e feliz, (posso tratar-te por "tu"?), por saber que te interessas pela cultura. É bom haver continuidade por parte dos mais novos. Só tenho pemna de não ter feito ainda "escola " em Campo Maior. Pode ser que algum dia alguém aparece e me siga as pisadas.
Espero que continuemos o contacto, apesar de não saber bem para quem estou a escrever.
Felicito-te pelo bom gosto, pela boa escrita e pelo excelente blogue. Parabéns!
Um abraço,
Vasco

Joaquim Candeias disse...

Olá Sr. Zé Camões
ainda bem não venho por cá mas hoje em especial venho agradecer a sua visita ao meu sitio.
embora passe sem comentar mas passo para ver o que o amigo vai postando, eu tambem como costumo dizer, os blogues vão vivendo pelas visitas embora por veses são os comentarios que os fazem sobreviver. bom fim de semana.

luis lourenço disse...

li e vi tudo com atenção...apreciei em doses homoepáticas.

abraço

Ana Tomás disse...

Não há problema algum, pelo contrário. O que posto (pelo manos até agora) não são criações minhas e faço-o com objectivo de partilhar imagens/palavras que me dizem algo. É bom saber que não sou a única a aprecia-las.
:)

quem ainda aqui anda perdido no blog disse...

"Sempre pensei que «não pares» era uma palavra só."
O texto. Muito bom.